terça-feira, junho 15, 2010

 

RELAÇÕES DE PODER NO UNIVERSO SÓCIO-CULTURAL DA ERA VARGAS (1930-1945)






Universidade do Estado da Bahia – UNEB
Campus X – Teixeira de Freitas – Depto. de Educação
Curso: História V
Disciplina: História do Brasil (século XX)
Docente: Profa. Liliane Maria Fernandes Cordeiro Gomes
Acadêmico: Cláudia Coelho, Elane Carvalho, Elizabete Saldanha, Elizama Lima, Elizama Costa, Hermas Caiuby, Janaína Rios, Joelma Carvalho, Tácio Brito.
20/08/2009

RELAÇÕES DE PODER NO UNIVERSO SÓCIO-CULTURAL DA ERA VARGAS (1930-1945)

Como deveria ser o Brasil moderno? Esta pergunta mostrava uma preocupação generalizada (de políticos, militares, empresários, trabalhadores, médicos, educadores e, também, de artistas e intelectuais) com a identidade do país, na década de 1920. Procurou-se uma colocação dentro dos padrões internacionais através da literatura, das artes plásticas, da música, tendo como ponto de partida a Semana de Arte Moderna de 1922. Mas, além disso, surgiram propostas para reformas na organização social e nas instituições, começando pela Constituição de 1891.
A entrada do Brasil na modernidade foi parte de um processo complexo em que se entrecruzaram dinâmicas diferentes. Nas primeiras décadas do século XX aceleraram-se a industrialização, a urbanização, o crescimento do proletariado e do empresariado. De outro lado, permaneceram a tradição colonialista, os latifúndios, o sistema oligárquico e o desenvolvimento desigual das regiões. De toda forma, com a expansão dos centros urbanos, modificaram-se os valores da cultura cotidiana e os próprios padrões da comunicação social. As idéias de simultaneidade, concisão, fragmentação, velocidade e arrojo passaram a expressar os tempos modernos. As Kodaks, o cinema e as revistas ilustradas captavam um mundo feito de imagens. Era inevitável que a arte expressasse as transformações trazidas pela modernidade. Mas, no Brasil, outros problemas também preocupavam artistas e intelectuais. "Nós não nos conhecemos uns aos outros dentro do nosso próprio país." A frase, do escritor carioca Lima Barreto, caracteriza bem o espírito da década de 1920. Era um tempo de indagações e descobertas. A tarefa que se impunha era a de construir a nação, e isso significava também repensar a cultura, recuperar as tradições, costumes e etnias que haviam permanecido praticamente ignorados pelas elites. A questão da identidade nacional estava agora em primeiro plano: que cara tem o Brasil? Artistas e intelectuais buscaram responder a essa pergunta, e esse esforço foi uma característica importante do modernismo brasileiro. Isso não quer dizer que o modernismo tenha sido um movimento homogêneo. Ao contrário: produziu imagens e reflexões sobre a nacionalidade profundamente contrastantes entre si.
A Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo no ano de 1922, representou uma verdadeira "teatralização" da modernidade. Mas o movimento modernista não se resumiu à Semana. Na verdade começou antes de 1922 e se prolongou pela década de 1930. Tampouco se restringiu a São Paulo. Houve também uma modernidade carioca, e a proliferação de revistas e manifestos por todo o país indica que o raio de ação do movimento foi maior do que se supõe.
Assim como a Exposição Universal do Rio de Janeiro de 1922, a Semana de Arte Moderna fazia parte da agenda oficial comemorativa do Centenário da Independência. O evento teve grande impacto na época, pois formalizou e discutiu questões que já se estavam esboçando na vida cultural. Por exemplo: como integrar tradição e modernidade? regional e universal? popular e erudito?
Mário de Andrade defendia a perspectiva de integração dinâmica do passado ao presente. No "Prefácio interessantíssimo" de seu livro de poemas Paulicéia desvairada (1922), definia o passado como "lição para meditar não para reproduzir". A tradição em si não tinha valor, a não ser que estabelecesse um elo vivo com a atualidade. Era esse o sentido dos estudos folclóricos a que se dedicou. Seu célebre livro Macunaíma (1928) mostra um herói que nasce índio, torna-se negro e no final é branco. O herói Macunaíma sobrevoa o Brasil nas asas de um pássaro. O que importava era destacar a nossa multiplicidade étnico-cultural, vislumbrar o conjunto da nacionalidade.
Outro autor modernista de renome, Oswald de Andrade, propunha no "Manifesto pau-brasil" (1924) uma síntese capaz de unir o "lado doutor" da nossa cultura ao lado popular. Já no "Manifesto antropofágico"(1928), sugeria um projeto de reconstrução da cultura nacional. Metaforicamente, deveríamos devorar e absorver de maneira crítica as influências do "inimigo" externo. As idéias do futurismo, do dadaísmo e do surrealismo poderiam ser integradas à nossa cultura desde que fossem reelaboradas. No quadro de Tarsila do Amaral intitulado "Abaporu" - que significa "o homem que come" - está expressa plasticamente a idéia da integração cultural.
O grupo dos verde-amarelos, por sua vez, tinha idéias bastante diferentes: propunha um "retorno ao passado", considerado como o depositário das nossas verdadeiras tradições. Via no popular, com sua índole pacífica, a alma da nacionalidade, a ser guiada pelas elites político-intelectuais do país. No manifesto "Nhengaçu verde-amarelo" (1929), defendia as fronteiras nacionais contra as influências culturais estrangeiras. Nesse ponto o grupo reforçava a tese do nacionalismo militarista de Olavo Bilac, fundador da Liga de Defesa Nacional e criador da figura do "poeta-soldado". As idéias dos verde-amarelos seriam mais tarde incorporadas pelo regime autoritário do Estado Novo (1937-1945).
Entre os intelectuais dos anos 20 cujas análises visavam à definição de novos rumos para o país, incluíam-se Oliveira Viana, Gilberto Amado, Pontes de Miranda. Eles escreveram ensaios que foram publicados em 1924 em uma coletânea organizada por Vicente Licínio Cardoso, chamada À margem da história da República. Na base de seu ideário estava o pensamento do político e escritor fluminense Alberto Torres.
Um dos nossos maiores problemas, na opinião desses pensadores, era a debilidade do governo federal. A Constituição de 1891 estava a seu ver ultrapassada, e isso por dois motivos principais: possuía inspiração externa e assegurava grande poder aos estados em detrimento do poder central. Urgia que o país construísse seu próprio modelo e criasse instituições adequadas à realidade nacional.
Após a Revolução de 1930, o Estado lançou as bases de uma política cultural que teve como marco inicial a criação do Ministério da Educação e se desdobrou na formação de diversos outros órgãos. Intelectuais das mais diversas formações e correntes de pensamento, como modernistas, positivistas, integralistas, católicos e socialistas participaram desse entrelaçamento entre cultura e política que caracterizou os anos 30, ocupando cargos-chaves na burocracia do Estado. Apresentando-se como uma elite capaz de "salvar" o país, os intelectuais reinterpretaram o passado, buscaram captar a realidade brasileira e construíram vários retratos do Brasil.
A ideologia revolucionária formulada nos primeiros anos da Era Vargas veio revelar fortes pontos de contato com as propostas antiliberais desde então defendidas por intelectuais como Oliveira Viana, Azevedo Amaral e Francisco Campos, que se tornou o primeiro ministro da Educação.
Para esses autores, os principais responsáveis pela crise brasileira eram as oligarquias rurais que se haviam apoderado do Estado graças às deficiências do modelo de governo liberal-federalista introduzido pela Constituição de 1891, incapaz de resolver os problemas nacionais. A experiência liberal, não só brasileira, mas mundial, esgotara-se, e com ela instrumentos clássicos como os partidos políticos e o Congresso. Caberia ao governo central tomar as rédeas do poder e ditar as diretrizes do desenvolvimento brasileiro. Essas idéias eram compartilhadas pelas lideranças tenentistas, que no início do Governo Provisório ocupavam cargos estratégicos nos estados e na administração central.
Mas Vargas não se cercou apenas de "tenentes". Sua política cultural envolveu a nomeação de intelectuais para postos de destaque e a criação de diversos órgãos capazes de atraí-los para junto do governo. Assim, em 1930, o arquiteto Lúcio Costa foi indicado para a direção da Escola Nacional de Belas Artes. Manuel Bandeira foi convidado, em 1931, para presidir do Salão Nacional de Belas Artes. Em 1932, o escritor José Américo de Almeida assumiu a pasta da Viação e Obras Públicas. Gustavo Capanema foi nomeado em 1934 ministro da Educação e Saúde Pública, e convidou o poeta Carlos Drummond de Andrade para chefiar seu gabinete. Mário de Andrade iria assumir, em 1935, a direção do Departamento de Cultura da Municipalidade de São Paulo. Foi ele quem indicou, juntamente com Manuel Bandeira, o nome de Rodrigo Melo Franco Andrade para organizar e dirigir o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, principal instituição de proteção dos bens culturais do país que seria criada logo após o golpe do Estado Novo.
O governo Vargas também tinha um grande projeto universitário. As primeiras iniciativas nessa área, contudo, não couberam ao governo federal: foram a Universidade de São Paulo, criada em 1934 por Armando Sales, e a Universidade do Distrito Federal, criada em 1935 por Pedro Ernesto. Data somente de julho de 1937 a lei de criação da Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro.
A participação dos intelectuais na vida nacional respaldava-se na crença de que eles eram uma elite capaz de "salvar" o país, pois estavam sintonizados com as novas tendências do mundo e atentos às diversas manifestações da cultura popular. Os artistas e intelectuais tratavam em suas obras das questões sociais que estavam na ordem do dia e participavam do debate político-ideológico entre a direita e a esquerda que mobilizava o mundo. Nos livros publicados por uma indústria editorial em expansão, aprofundava-se a temática da cultura negra, indígena e caipira. Através da literatura proletária e do romance regionalista fazia-se a crítica dos valores da sociedade patriarcal e oligárquica identificados com o tempo passado. Interessava agora retratar a vida do homem comum das cidades e dos sertões.
Em 1933, Gilberto Freyre publicou Casa Grande e Senzala, obra que modificava o enfoque da questão das raças formadoras do país e fazia a defesa da colonização portuguesa, expressa na idéia da democracia racial. Caio Prado Jr. escreveu Evolução política do Brasil, livro de orientação marxista que enfatizava a participação das camadas populares na história nacional. Em 1936, Sérgio Buarque de Holanda publicou Raízes do Brasil. Nessa obra o autor se contrapunha a Gilberto Freire ao ressaltar a necessidade de o país superar as raízes culturais portuguesas como condição para entrar na modernidade.
Na década de 1930 houve um debate intelectual e político sobre que matriz regional expressaria melhor a nacionalidade. Além da sociedade nordestina retratada por Gilberto Freyre, tinha-se nos textos de Cassiano Ricardo a defesa da sociedade bandeirante como modelo para a democracia brasileira. Alceu Amoroso Lima, por sua vez, apontava na sociedade mineira traços do espírito de família e de religiosidade que seriam os verdadeiros valores da civilização brasileira.
Após a Revolução de 1930 observou-se uma tendência de diversificação cultural e, ao mesmo tempo, de integração política nacional, que permitiu realizar aspirações já formuladas nos anos 20. A cultura se beneficiou das mudanças na educação, na literatura e nos estudos brasileiros, assim como da melhoria da qualidade do livro e do crescimento do mercado editorial.
Com o auxílio do Ministério da Educação e do Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), o regime autoritário do Estado Novo articulou uma dupla estratégia de atuação na área cultural, voltada tanto para as elites intelectuais como para as camadas populares. Ao mesmo tempo em que incentivava a pesquisa e a reflexão conduzidas pelos intelectuais reunidos no ministério chefiado por Gustavo Capanema, o governo estabelecia, via DIP, uma rígida política de vigilância em relação às manifestações da cultura popular. A propaganda do regime foi facilitada pelo controle dos mais variados meios de comunicação, e seus instrumentos principais foram o rádio e a imprensa.
Nomeado ministro da Educação no início do governo constitucional de Getúlio Vargas, em 1934, Gustavo Capanema manteve-se à frente do ministério durante todo o Estado Novo. Manteve igualmente o grupo de intelectuais que o assessorava, do qual faziam parte Carlos Drummond de Andrade, Mário de Andrade, Rodrigo Melo Franco de Andrade e outros. Os projetos que vinham sendo desenvolvidos tiveram continuidade, o que resultou na implantação definitiva de órgãos como a Universidade do Brasil, o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e o Instituto Nacional do Livro. Também foi consumada a reforma do ensino secundário e foi estimulado o ensino profissionalizante, que permitiria a criação do Senai e do Senac. A afirmação dos princípios católicos na condução do ensino superior se faria com a abertura das Faculdades Católicas, que daria origem à criação da Pontifícia Universidade Católica. Modernizar a educação, incentivar a pesquisa e preservar as raízes culturais brasileiras foram metas almejadas pelos intelectuais que cercavam o ministro Capanema, mas essas metas nem sempre foram alcançadas, pois muitas vezes esbarravam nos procedimentos centralizadores e burocráticos do regime.
No DIP, sob a liderança de Lourival Fontes, iriam reunir-se os remanescentes do modernismo conservador representado pela corrente dos verde-amarelos. Foi esse grupo que traçou efetivamente as linhas mestras da política cultural do governo voltada para as camadas populares. Uma das metas fundamentais do projeto autoritário era obter o controle dos meios de comunicação, garantindo assim, tanto quanto possível, a homogeneidade cultural. A ideologia do regime era transmitida através das cartilhas infanto-juvenis e dos jornais nacionais, passando também pelo teatro, a música, o cinema, e marcando presença nos carnavais, festas cívicas e populares.
Em 1940, a Rádio Nacional foi encampada pelo governo. Logo em seguida, foi a vez dos jornais A Manhã e A Noite. O jornal A Manhã, sob a direção de Cassiano Ricardo, e a revista Cultura Política, sob a direção de Almir de Andrade, tornaram-se os porta-vozes do regime. Ambas as publicações contavam com a colaboração de intelectuais das mais diversas correntes. Já a revista Ciência Política reunia intelectuais de pouca projeção, voltando-se basicamente para a doutrinação das camadas populares. Buscava-se construir a imagem de uma verdadeira simbiose entre o governo e os intelectuais. Ao assumir sua cadeira na Academia Brasileira de Letras, em 1943, Vargas estaria simbolicamente corporificando essa comunhão de interesses. O curioso disso tudo é que, se a imprensa foi uma peça fundamental na definição e na difusão da ideologia do Estado Novo, seria também através dela que a imagem do regime começaria a ruir.
Seguramente o rádio foi um dos veículos de maior eficiência na difusão do projeto político-pedagógico estadonovista. A Rádio Nacional contava com expressiva verba oficial para manter o melhor elenco da época, incluindo músicos, cantores, radio atores, humoristas e técnicos. Em seus programas transmitiam-se os padrões de comportamento e valores desejáveis. Buscando monopolizar a audiência popular, o governo instituiu concursos musicais em que a opinião pública elegia seus astros favoritos. A apuração era feita no DIP, e o resultado era transmitido durante o programa "Hora do Brasil". Em agosto de 1941, foi criado o "Repórter Esso", jornal radiofônico inspirado no modelo norte-americano com notícias procedentes da United Press International (UPI). A Rádio Mauá, diretamente ligada ao Ministério do Trabalho, e autodenominando-se "a emissora do trabalho", popularizava a imagem de Vargas.
Com o objetivo de incentivar as manifestações cívicas, o governo deu apoio ao projeto orfeônico de Villa-Lobos. As apresentações de canto orfeônico eram comuns durante as grandes concentrações populares no estádio do Vasco da Gama. O povo era considerado uma espécie de matéria bruta a ser elaborada pelo saber das elites. Baseado nesse raciocínio, o governo justificava seu controle e fiscalização sobre as mais diversas expressões culturais. Até mesmo a linguagem popular era alvo desse tipo de controle.
Foi durante o Estado Novo que surgiu o chamado "samba da legitimidade", em que se buscava converter a figura do malandro na figura exemplar do operário de fábrica. O DIP incentivava os compositores a exaltar o trabalho e abandonar a boemia. Também através do samba se ensinava a repudiar o comunismo como ameaça à nacionalidade ("Glória ao Brasil", 1938). Procurando construir uma imagem positiva do governo junto aos artistas, em 1939 Vargas criou o "dia da Música Popular Brasileira".
Com construções arquitetônicas sólidas como o Ministério da Guerra e a estação da Central do Brasil, procurava-se demonstrar a força e pujança do regime. Mas também se ousava nos pilotis e nos painéis do edifício-sede do Ministério da Educação. Foi essa combinação entre conservadorismo e arrojo a marca do Estado Novo na área cultural.
Nas artes plásticas, “grã-finos” e proletários consagraram o modernismo, com a fundação de clubes de vanguarda que contaram com a participação de nomes como Lasar Segall (judeu russo radicado em São Paulo), Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Cândido Portinari. Em 1932, na Bahia, o artista José Guimarães promoveu a primeira exposição de pintura moderna de Salvador. Nos anos 40, ficariam famosos nomes como o do baiano Mário Cravo Júnior e os dos pernambucanos Lula Cardoso Aires e Augusto Rodrigues. Em 1938, a revolução artística chega ao Rio Grande do Sul, deflagrada por Carlos Scliar. Em Fortaleza surgem, em 1941, Antônio Bandeira e Aldemir Martins. Em Minas irão se destacar Lígia Clark e Mary Vieira.
E assim, intelectuais e artistas construíram vários retratos do Brasil para a reorganização da sociedade, em um Brasil novo, um Brasil Moderno, fazendo parte do contexto mundial.


REFERÊNCIAS

FGV-CPDOC. Escola de Ciências Sociais e História da Fundação Getúlio Vargas. Desenvolvido pelo Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil. Disponível em: , s.d. Acesso em 16 ago. 2009.

MARTINS, Simone R.; IMBROISI, Margaret H. História da Arte. Disponível em: , s.d. Acesso em 16 ago. 2009.

Comments:
adorei seu blog, cheio de ilustrações, breve chegarei lá. Continuem postando assuntos interessantes sobre história, para que seus colegas de hisdtória VII se atualize no contexto em epigrafe.
 
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